Não sei onde li, se li ou se estou a inventar, que cerca de uma quarta parte dos gastos com a alimentação, dos portugueses, é dedicada para comer fora do lar, doce lar, onde além do mais há que lavar os pratos.
Como em casa de cada um, em nenhuma parte se come pior, incluindo esses restaurantes de um único garfo que não figuram nos guias gastronómicos, nem tão pouco nas listas telefónicas, tão pródigas em direcções de pizzas ao domicílio.
A catástrofe culinária, há que atribuí-la a quem como, se acabaram os ciganos que iam pelo monte sós, acabaram-se também as avós que passavam as manhãs guisando comidas lentamente, tão lentas e tão boas como elas.
Extinta essa geração benemérita, as suas filhas decidiram entaipar a cozinha e a chegada ao auge dos alimentos certificados.
A chamada comida rápida deveria sê-lo ainda mais, para que passe ao largo sem deter-se na nossa porta.
Explicou-me Azorin (*), que era duma sobriedade como a que se vem atribuindo injustamente a alguns monges, que há que diferenciar entre o que é comer e o que é ingerir.
Nada tem uma coisa a ver com a outra, já que na segunda não há nada que seja a pedir da boca ainda que nos entre pelo mesmo sítio.
Em modos alimentares do português médio, em cujo amplo catálogo nos incluímos todos, excepto alguns construtores e determinados directores do urbanismo, repercutiram no aforro das famílias, que agora só chega a, 2 a 3 % dos seus rendimentos e só para alguns diminutos.
O primeiro é o primeiro e com as coisas de comer não se brinca.
Temos que sair para a rua em busca do pão e do aperitivo.
Vivemos tempos de mudança, na suposição de que todos não o façam e devemos adaptarmo-nos a esta época.
Rapidamente apareceriam à venda as colheres nas lojas dos antiquários.
Relembrarão alguns, um olor daqueles dos mais velhos e dos velhos tempos, não por uma foto em sépia, num qualquer álbum.
(*)
José Martínez Ruiz, conhecido como Azorín, nasceu em Monóvar (Alicante) em 1873 e morreu em Madri em 1967.
Autor prolífico, Azorín foi um dos maiores escritores espanhóis do século XX, tendo sido eleito para a Real Academia Española em 1924.
Publicou mais de vinte livros e uma grande quantidade de artigos nos quais soube combinar as paixões e inquietações de sua geração com as paisagens e tradições da velha Espanha.
Grande observador e estilista, tudo o que Azorín escreveu desperta o vivo interesse do leitor.
(Wilkipédia)
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