segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Por um punhado de, “UM RIM”





O famoso reality-show holandês que quis sortear um rim, acabou, tudo não passando duma ficção publicitária.

Não sem se ouviram ou leram, mas vou contar o filme: a cadeia holandesa de TV BNN, um reality da ENDOMOL, uma doente terminal que oferece um rim e três doentes à espera dum transplante, competem para ver quem tem a sorte de o levar.

Escândalo, polémica, intervenção dos poderes públicos.

Finalmente a cadeia de TV, aclara tudo: a doente doadora, era uma actriz e o ruidoso anúncio era uma estratégia publicitária, para alertar e animar a população, para doarem os seus orgãos.

Verdade?

Mentira?

Quando alguém te engana uma vez, à segunda não podes estar seguro de que diga a verdade.

De qualquer maneira, não haverá competição de doentes pelas vísceras.

Há quem tenha respirado aliviado depois de saber que tudo era uma artimanha publicitária.

Eu creio que era exactamente o contrário!

Até agora, o que tínhamos exposto, era que uma cadeia de televisão e uma produtora, habituadas a levar as coisas demasiado longe, davam um novo passo em frente, num caminho que já bem conhecíamos.

O que temos a partir deste momento, pelo contrário, é realmente grave e mais a mais, amarra-nos numa dinâmica de consequências imprevisíveis: já não estamos contra o habitual atentado à dignidade humana, ofensiva esta a que ainda não estamos preparados para responder-lhe, mas sim, agora, temos de enfrentar o desaparecimento absoluto do critério de verdade, nas estratégias do ecrã da televisão.

Se alguém te quiser roubar a carteira, sabes o que deves fazer: defender o teu direito de propriedade, o qual passa pela polícia e pela defesa própria.

Mas se o que ocorre é que aparece um larápio que te diz ir roubar-te a carteira, pões-te em posição, tipo Bruce Lee e, em transe, o larápio tira o disfarce e diz-te que é um polícia e que tudo não passa duma brincadeira com uma câmara oculta, “olhe, está ali a câmara!”, então:

1) – Ficas com cara de imbecil

2) – O direito que ias esgrimir fica convertido em algo menor e como desdenhável.

3) – O autor da “brincadeira” de mau gosto ri-se nas tuas “ventas” e ainda tens que dar graças porque era tudo uma piada .

As opções, 1), 2) e 3), acumulam-se no baixo-ventre e nesses momentos, não sabes se hás-de pegar fogo à sede da BNN, por chulos, ou voltares a tua casa, com a cabeça coberta com a gabardina e decidido a não saíres mais por aí fora, onde o perigo da televisão poderá acessar.

Alguém acreditou na BNN, que era para tomar o pulso ás pessoas, para enganar o público, para gozar brincando com o conceito comum de dignidade, empregando-o como ferramenta de uma chicana, por mais social que seja a sua motivação ?

Alguém comparará, este episódio, com o de Orson Welles e os seus marcianos radiofónicos .

Mas há uma grande diferença: na época de Welles e incluso na nossa, uma invasão marciana, era inverosímil; hoje, pelo contrário, é verosímil que a televisão rife um rim !!!

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